Porque o omnichannel não vai emplacar no Brasil
Editado por Silmara Schupel.
17.07.2015 17:30
Tamanho do mercado, falta de cultura de inovação, alta carga tributária e má formação do trabalhador matam qualquer possibilidade do conceito funcionar por aqui
*Por Roberto Meir
O mercado brasileiro adora importar expressões, manias e modismos dos Estados Unidos. Talvez por um problema de autoestima, o fato é que vemos o que vem de fora como algo mágico, fantástico, que irá resolver todos os problemas dos processos de negócios das empresas e, rapidamente, fazer com que nossa sociedade de consumo seja realmente de primeiro mundo. Grande ilusão.
A realidade mais complicada
A realidade é muito mais complicada do que os discursos de marketing das consultorias e empresas de tecnologia querem nos mostrar. Vivemos em um país cuja mão de obra tem baixa qualificação, em que a educação é de péssimo nível, em que temos problemas gigantescos de infraestrutura e no qual os investimentos em tecnologia e em inovação são pífios. Não à toa, o trabalhador brasileiro tem apenas um quarto da produtividade do americano, um abismo que vem aumentando nos últimos anos, e o País vem perdendo competitividade a olhos vistos. Na corrida da inovação e da competência, estamos andando para trás.
Em meio a tudo isso, tentam nos convencer de que a moda do omnichannel vai pegar no Brasil e será a solução dos problemas de atendimento ao cliente, ruptura de estoque e baixa produtividade. Não, não será. E explico os motivos.
Mercado com escala menor
Em primeiro lugar, nosso mercado tem uma escala muito menor. Poucas são as redes, mesmo incluindo as franquias, que têm mais de 500 lojas no Brasil. Nos Estados Unidos, qualquer rede regional atinge esse tamanho. E tamanho é, sim, documento: mais escala gera custos unitários menores, mais faturamento, mais oportunidades de lucro e ganhos de produtividade.
Se o mercado é bem menor, o custo de implantação de qualquer sistema é maior e o mercado como um todo fica menos interessantes para fornecedores de soluções.
Ainda relacionada à escala está a questão das oportunidades de inovar. Em uma estrutura maior é possível testar processos, ferramentas e tecnologias diferentes em lojas diferentes e acelerar a obtenção de respostas. Uma rede de 600 lojas que faça três testes diferentes em 20 lojas-piloto tem resultados mais rápidos do que alguém que só consegue testar uma coisa por vez. Como no Brasil temos, de modo geral, redes pequenas e medo de inovar nós perdemos duplamente essa oportunidade.
Mais um complicador é a questão tributária: os impostos inacreditáveis cobrados para sustentar uma sociedade pouquíssimo produtiva (e Brasília é somente a parte mais visível dessa cultura parasitária e do "meu primeiro" que existe de norte a sul) paralisam quem tem disposição (ou teimosia) para continuar a investir por aqui.
É sempre mais fácil buscar um favor de alguém, ao invés de batalhar por uma sociedade mais justa. Isso também inibe a inovação e nos mantém no atraso. O fato de, em pleno século XXI, o Estado mais rico do Brasil conviver com falta de água e epidemia de dengue (problemas típicos do século XIX) só mostra o quanto estamos ficando para trás.
Some tudo isso à educação de péssima qualidade que gera pessoas formadas na faculdade que mal conseguem compreender um texto e temos um cenário pavoroso, que impacta empresas de todos os segmentos, indistintamente. Esse é o verdadeiro nó do Brasil.
Pois bem: as consultorias internacionais e as gigantes de software querem vender ao varejo soluções mágicas deomnichannel, que, por causa da falta de escala do mercado e dos impostos, custam três vezes mais que nos Estados Unidos, exigem um aprendizado muito maior e pressupõem uma estrutura que ainda é de sonhos para a maior parte das empresas. Empresas de mais de R$ 1 bilhão de faturamento anual ainda controlam estoque no Excel e você acredita queomnichannel irá emplacar?
Melhor fazer primeiro o básico muito bem feito, para depois perder tempo com discursos megalomaníacos.
*Roberto Meir é especialista internacional em relações de consumo, varejo e estratégias de relacionamento com stakeholders. Além disso, Meir responde pela autoria dos livros "O Brasil que Encanta o Cliente", "Ativos Intangíveis - O Real Valor das Empresas", "Do Código ao Compromisso - Propostas Efetivas para a Melhoria dos Serviços ao Consumidor no Brasil" e os mais recentes "Feitas para o Cliente - As Verdadeiras Lições das Empresas Feitas para Vencer e Durar no Brasil" e "A Era do Diálogo"
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