Chuva na Baixada Fluminense expõe drama de idosos em meio ao caos
Chuva na Baixada Fluminense expõe drama de idosos em meio ao caos
André NaddeoDireto de Nova Iguaçu (RJ)
O Terra ouviu o relato de quatro personagens, todos com mais de 60 anos de idade, moradores das três cidades mais atingidas pelo temporal da última quarta-feira no Estado do Rio de Janeiro: Nova Iguaçu, Queimados e Japeri. E revela o drama de quem não tem mais idade para suportar a dor da perda e o esforço para recomeçar, muitas vezes, tudo do zero.
Aposentado e morador do bairro de Austin, em Nova Iguaçu - cidade que decretou estado de calamidade -, na Baixada Fluminense, Walter Adriano de Jesus, 65 anos, saiu para comprar pão e, quando voltou para sua casa, encontrou canos estourados e o muro de sua residência no chão.
"Acordei e chovia muito. Sempre tive o costume de acordar cedo. Gosto de pão quentinho. Fui até a padaria, era mais ou menos 5h45. Quando eu voltei, meu muro da entrada de casa estava todo no chão. Minha esposa acordou no susto. Moramos nós dois aqui. Meu filho ajuda, claro, mas ele tem que trabalhar. E eu não tenho dinheiro e nem força para fazer um muro novo. Os canos estão estourados. A Cedae (companhia de abastecimento de água do Rio de Janeiro) disse que vai vir reparar. Duvido. Vou tirando os tijolos aos poucos, como eu posso. Um rapaz aqui da rua trouxe uma madeira e me ajudou a fechar minha casa."
A aposentada Carmen Lúcia Augusto, 73 anos, moradora de São Francisco, na cidade de Queimados, sofre de osteoporose, tem dificuldades para andar e precisou da ajuda de sua filha e sua neta para deixar sua casa, que, segundo ela, "não caiu pela misericórdia de Deus".
"Essa casa não caiu pela misericórdia de Deus. Eu estava com minha neta, e minha filha. Foram eles que me socorreram e me tiraram. Eu tenho osteoporose, não consigo andar direito. E sofro de diabetes e sou hipertensa. Me sinto jogada aqui, esquecida. Qualquer chuva aqui é esse mesmo sofrimento. Para uma senhora que não anda direito, o que vai acontecer se vier outra chuva como essa? Nas eleições, todo mundo vem com promessa. E fica nisso. Perdi um bocado de roupa. E roupa de velha não é fácil de arrumar, né? Estou precisando de ajuda. Meu guarda-roupa caiu, perdi móveis, mas daqui eu não saio. Se Deus me deu, o diabo não tira."
Sem dormir desde a madrugada de quarta-feira, Adílson Corrêa, 61 anos, que faz bicos como segurança e mora no município de Japeri, decidiu fazer um muro na porta de sua casa por causa de "tanta água que caiu". "É o jeito. Ficou feio. Mas pelo menos segura um pouco a água."
"De tanta água que caiu, resolvi fazer um muro na porta da minha casa. É o jeito. Ficou feio. Mas pelo menos segura um pouco a água. Me sinto cansado. Faço uns bicos de segurança numa propriedade perto daqui. Mas me sinto cansado. Desde a chuva da última madrugada (de quarta-feira) que eu praticamente não durmo. Moro sozinho. Os vizinhos ajudam. Mas eu não posso parar. É minha casa. Coloquei todas as coisas para o alto. Salvei o que eu pude. Agora tem que lavar tudo, estou com sono, minhas costas estão doendo. E ainda estou com medo de que venha outra chuva como aquela e destrua tudo de uma vez."
Com 83 anos de idade, o aposentado João Honório Trajano, morador de Queimados, afirmou que perdeu três móveis, seis quilos de mistura e 10 de arroz, toda sua "compra do mês". "A gente dorme com a mosca na orelha. Sempre de prontidão. Agora há pouco eu tirei um soninho para não maltratar as ideias, mas ainda estou cansado."
"Eu já estava esperando essa chuva. Aqui, como o amigo ali disse agora, a gente dorme com a mosca na orelha. Sempre de prontidão. Agora há pouco eu tirei um soninho para não maltratar as ideias, mas ainda estou cansado. Estava tirando água de casa até agora. Me emprestaram uma bomba. Mas perdi uns seis quilos de mistura, mais uns 10 de arroz. A compra do mês foi embora. Perdi uns três móveis. Estou com dor nas costas de tanto abaixar para mexer na bomba e passar o rodo. Mas não faz mal. Não tenho medo dos castigos de Deus."
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