Após dez dias de homenagens, África do Sul enterra ‘pai Mandela’
Ícone da luta antiapartheid, ex-presidente morreu no dia 5, aos 95 anos.
No país de Madiba, tristeza se mistura com felicidade por ele ter existido.
Diz um provérbio sul-africano que quando um grande homem morre, ele não vai sozinho. Significa que a morte de alguém importante carrega com ela outras almas que servem de "travesseiro" para a passagem e que o protegem. Se assim for, Nelson Mandela levou com ele o espírito de toda uma nação – e de boa parte do planeta
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Com uma história de vida que virou filme, livro e exemplo, Mandela conseguiu unir uma nação dividida entre brancos e negros e fazer os sul-africanos acreditarem que poderiam ganhar o jogo – e assim construir um país melhor. A impressão que se tem, observando as despedidas para Mandela nas ruas, é que, pelo menos para a África do Sul, vale a letra de uma das canções mais entoadas nesses últimos dez dias de homenagens: "não há ninguém como ele".
Desde o dia 5, quando o líder morreu, aos 95 anos, o país lamenta a perda celebrando a vida. O nome de Mandela aparece entre as afinadas cantorias pelas ruas, em fotos e quadros exibidos em lojas e hotéis, estampado em camisetas, faixas e outdoors de Johanesburgo e de Pretória – por onde passou a reportagem do G1.
Entre as falas das pessoas sobre Madiba (nome do clã de Mandela e como ele é conhecido), as palavras mais presentes são "pai" e "libertador". De fato, para a enorme maioria negra do país – 75% da população – Mandela representou o fim de um regime segregacionista que impôs, a quem não era branco, restrições para viajar, estudar, andar e existir como cidadão. Por 46 anos.
O estádio com capacidade para 90 mil pessoas – e ocupado quase até a metade – vibrava com músicas típicas e danças antes do início da cerimônia. Mas o que era para ser uma celebração do povo foi na verdade uma repetição de discursos formais – com a cereja do bolo ficando com o falso intérprete da língua dos sinais.
Alguns discursos foram ovacionados – como o do presidente americano, Barack Obama, e surpreendentemente o do secretário-geral da ONU, Ban Ki Moon. Outros não foram sequer ouvidos – como a fala da presidente Dilma Rousseff, traduzida para o inglês num volume inaudível.
Já o presidente do país, Jacob Zuma, enfrentou talvez sua pior humilhação desde que foi eleito, com vaias quase unânimes – uma mostra da popularidade em queda após escândalos de corrupção que dividem o partido.
A segunda despedida foi a exibição do corpo na sede do poder Executivo, em Pretória. Por dois dias e meio, em horário comercial de quarta a sexta, os sul-africanos puderam tentar um lugar na enorme fila que se formava para passar caminhando – parar era proibido – por Mandela. Mas, segundo as contas do governo, apenas 100 mil conseguiram. Uma amostragem pequena para a vontade dos admiradores do "libertador".
O último adeus foi neste domingo, pela TV. O enterro de Mandela ocorreu em Qunu, o pequeno vilarejo onde ele cresceu. Esperava-se uma peregrinação de pessoas pela estrada, mas no fim poucos se animaram a ficar embaixo do sol forte quando o mais perto que se poderia chegar da tenda era a quilômetros de distância.
Esta segunda-feira (16) é feriado na África do Sul, data em que se relembra a Batalha do Rio Sangrento, entre os boers e o Império zulu no século XIX. Foi o dia escolhido pelo "Mandela-radical" para lançar sua luta armada contra o Apartheid em 1961, antes de ser preso. Também foi a data em que o "Mandela-paz-e-amor" adotou como Dia Nacional da Reconciliação depois de libertado e eleito presidente. E será, nesta segunda, o primeiro sem o homem Mandela.
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