sábado, 6 de junho de 2015

O General Leônidas e o Golpe Militar de 1985

O General Leônidas e o Golpe Militar de 1985

Leônidas sorrindo (d) e Sarney boquiaberto 

Por Jorge Serrão - serrao@alertatotal.net

O brasileiro tem um outro pecado tão ou mais grave quanto seu desapreço pela democracia verdadeira ou a submissão a aceitar sobreviver, passivamente, sob tutela de um Estado Capimunista, autoritário, cartorial, cartelizado, centralizador, perdulário e corrupto. Nós cultivamos um falso sentimentalismo pessoal que atrapalha a compreensão correta da leitura histórica, e nos faz repetir os mesmos erros do passado, de maneira recorrente. Costumamos não fazer a autocrítica e a crítica certeira, nem na hora da morte.

Ontem, morreu um dos mais brilhantes e influentes militares brasileiros. Aos 94 anos de idade, após complicações geradas por um tombo, faleceu o General de Exército Leônidas Pires Gonçalves. O velório do ex-ministro do Exército acontecerá das 8h 30min às 11h30min deste sábado, no Palácio Duque de Caxias, sede do Comando Militar do Leste, no Rio de Janeiro. O corpo de Leônidas (que deixa esposa, 2 filhos, 4 netos e 7 bisnetos) será cremado, a partir das 13 horas, no Crematório São Francisco Xavier, no bairro do Caju.

Já que Leônidas veio do pó e à poeira retornará, como todos os mortais, vamos analisar a figura dele diante da História mal contada do Brasil. O General tem uma responsabilidade gravíssima. Leônidas foi o avalista da posse de José Sarney na Presidência da República. A decisão fora tomada em 15 de março - um dia depois do presidente eleito pelo Colégio Eleitoral do Congresso Nacional, Tancredo de Almeida Neves, ter sido fulminado por dores abdominais que o perseguiam desde a tensa campanha presidencial contra Paulo Maluf.

No dia 14 de março, Tancredo não aguentou. Um leiomioma benigno, porém infectado, estourou em sua região abdominal. A ordem dada foi esconder da opinião pública que Tancredo tinha um tumor. A palavra câncer sempre gerou pavor e denotava fragilidade e fatalidade programada. Mais que o medo da doença fatal, doente antes de tomar posse, Tancredo tinha o temor concreto de que o então Presidente João Figueiredo se recusasse a passar a faixa presidencial ao seu vice, naquele momento considerado um "traidor" dos militares. Naquele momento, amigos e familiares relatam que Tancredo teria pensado em uma famosa frase de Getúlio Vargas, de quem fora ministro: "No Brasil, não basta vencer a eleição, é preciso ganhar a posse"...

O General Lêonidas garantiu a de Sarney! Em meio à polêmica da posse, na madrugada do dia 15 de março, Leônidas se dirigiu a Sarney com um recado-nomeação: "Boa noite, Presidente". A História não batiza oficialmente, mas, Leônidas deu o "Golpe Militar de 1985" que colocou o vice de Tancredo no poder. A morte de Tancredo, após longa agonia, foi marketeiramente anunciada em 21 de abril - dia de Tiradentes, mártir mineiro. Aquela que seria batizada de "Nova República", após o governo dos presidentes militares, já nasceu literalmente morta, graças ao câncer de Tancredo e ao movimento de Leônidas.

A entrega do poder a Sarney atrasou o Brasil 1000 anos. O maranhense era um reconhecido "filhote da dita-dura". A diferença dele para Paulo Maluf como gestor é que o paulista realizou grandes obras por seu Estado e pela cidade de São Paulo, apesar dos notórios superfaturamentos. O que Sarney fez pelo Maranhão todo mundo sabe. O que ele fez (de besteira) pelo Brasil foi pior ainda. Até hoje Sarney reina. Renan Calheiros, presidente do Senado, não por acaso, é um de seus pupilos e herdeiros, junto com Edson Lobão, companhia limitada & sociedade anônima...

Leônidas tem culpa ou dolo pelo gesto pró-Sarney? No julgamento da História, a intenção dele não foi tomada isoladamente. O General era, simplesmente, a parte mais corajosa de um sistema. Ele acabou sendo o porta-voz de uma decisão tomada por forças muito acima - tanto políticas, quanto econômicas. Na sucessão dos militares, o desejo e o acordo feito era para impedir retaliações. A agenda foi cumprida direitinha na Era Sarney. O estilo linha-dura de Leônidas salvou o maranhense da degola com o agravamento de uma crise econômica brutal.

Como prova do tal "sentimentalismo tupiniquim", José Sarney usou seu site na internet para lamentar a perda do grande amigo Leônidas. O poeta maranhense proclamou que Leônidas foi "o último dos grandes chefes militares que tomaram parte nos acontecimentos centrais da História do Brasil na última metade do século passado". Sarney mandou publicar: "Foi um grande soldado, um profissional exemplar, com virtudes patrióticas e morais que o fizeram uma referência nas Forças Armadas. Sua participação na transição democrática foi decisiva e a ele devemos grande parte da extinção do militarismo — a agregação do poder militar ao poder político — no Brasil. Ele deu suporte a que transição fosse feita com as Forças Armadas e não contra as Forças Armadas. Pacificou o Exército e assegurou e garantiu o poder civil. Reconduziu os militares aos seus deveres profissionais, defendendo a implantação do regime democrático que floresceu depois de 1985".

Estamos sofrendo agora os efeitos daquela tal "democracia"... O gesto de Leônidas em favor de Sarney - acreditando que a decisão preservava as Forças Armadas, nem tão amadas pelo processo de guerra midiática que se acentuaria desde a campanha pelas eleições "Diretas, Já" - custou tão caro ao Brasil quanto outra decisão terrível: o chamado "golpe na revolução redendora de 1964", cometido em 13 de dezembro de 1968, com a decretação do desnecessário Ato Institucional número 5 (mais conhecido como AI-5). Foi um ato falho que vigorou por 10 anos, até 13 de outubro de 1978.

Voltemos ao Leônidas. Vale lembrar que foi Tancredo Neves quem o designou para ser seu Ministro do Exército. Após o falecimento de Tancredo, permaneceu à frente do Ministério durante os cinco anos do governo de José Sarney (1985-1990). Desenvolveu projetos como a FT-90 (Força Terrestre 1990), que permitiram a modernização do Exército Brasileiro, que dentre outras coisas adquiriu a sua Aviação. Isto foi coerente com a inteligência que o tinha levado a ser o primeiro colocado de sua turma na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME). Por tal mérito intelectual, Leônidas recebeu a Medalha Marechal Hermes de prata dourada com uma coroa.

Durante sua gestão, Leônidas tomou uma outra decisão histórica que custa muito cara às Forças Armadas no presente. Ele impediu a publicação doProjeto Orvil (livro ao contrário) que relataria, com provas documentais, todos os crimes cometidos pela chamada esquerda revolucionária e terrorista na História do Brasil, principalmente nas décadas de 70 e 80. Se tais relatos tivessem sido oficialmente publicados naquela época, muita polêmica inútil e mentiras fabricadas pelas Comissões da Verdade teriam sido, no mínimo, atenuadas.
  
O próprio Leônidas foi vítima do erro de ter censurado o ProjetoOrvil - hoje disponível na internet. Em dezembro de 2014, no relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), seu nome aparece como um dos responsabilizados por violações dos direitos humanos. No texto, a CNV lembra que, como chefe do Estado-Maior do I Exército na década de 1970, o General foi o chefe do Centro de Operações de Defesa Interna (CODI). Os revanchistas culpam Leônidas pelas ações violentas de repressão no âmbito da Operação Radar, contra o Partido Comunista Brasileiro (PCB), e do episódio conhecido como Massacre da Lapa, contra a cúpula dirigente do Partido Comunista do Brasil (PCdoB).

A História não perdoa aqueles que erram na estratégia... Os militares perderam a guerra ideológica, mas continuam vigorando, no inconsciente coletivo, como uma das mais admiradas e respeitadas instituições... basta ver as milhares de pessoas, nas redes sociais da internet, que cobram deles uma ação de parceria em uma "intervenção constitucional"...

Será que a morte de Leônidas servirá para que os militares entendam que não se pode cometer erro estratégico de avaliação na condução política?

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