Monólogo do comuna feliz
Editado por Silmara Schupel.
Arnaldo Jabor
“Eu sou mais eu. A direita do latifúndio e do imperialismo norte-americano estão massacrando meus ideais, mas eu não ligo. Eu sou mais eu. Eu tenho a linha justa. Eu e meu partido sabemos que sempre houve esta divisão entre oprimidos e opressores, desde que um macaco mais forte explorou macaquinhos, roubando-lhes as bananas. Não me venham com enganações tipo sociedade global, nova era, direitos humanos, esse papo furado. A história é a história da luta de classes – ponto. Nós somos o bem. Nós defendemos os oprimidos, e eles, os opressores. Por isso somos assim: nós e eles.
Estou convencido de que sou superior a esta manada de babacas, burgueses, alienados, como, por exemplo, aquela marcha de 2013, inventada pela CIA e adotada pela ‘elite branca’ que não suporta que os pobres andem de avião.
Eu sou superior, eu sou um agente da história que marchará com nossos militantes para um futuro cheio de delícias e harmonia, quando distribuiremos toda a produção como me disseram no cursinho do partido: ‘A cada um segundo suas habilidades, a cada um segundo suas necessidades.’ Nunca li Marx, mas sempre soube isso porque não precisei estudar – bastou-me o prefácio de um livro da Academia de Ciências da URRS. Os pobres são puros, e deles emana uma sabedoria que me basta. Por exemplo, pensei muito e digo: qual o problema de roubar, ou melhor, ‘desapropriar’ grana da Petrobras? Esse dinheiro todo servirá para financiar a marcha para o socialismo do século XXI, como batizou o grande Chavez.
Ah, que saudades da republica soviética, quando tudo marchava sob a batuta de Stalin com a produção industrial imensa. Claro que precisava mão de ferro para conseguir isso, e nosso guia o fez. É verdade que muitos reacionários resistiram, como os ‘kulaks’, os camponeses fascistas e sabotadores que queriam impedir a agricultura coletiva. Camponeses reacionários tinham de sumir. Teve de matar uns 20 milhões de ‘alienados’, mas era para o bem... E falam em massacre, violências e outras mumunhas, mas, como disse o traidor Trotsky: ‘Quem foi que disse que a vida humana é sagrada?’. Esta foi a sua única grande frase. O resto é lixo, que nosso Stalin raspou da terra, com a mão sagrada do vingador Ramon Mercader, no México onde Trotsky se gabava de comer a Frida Kahlo. Foi uma bela machadada naquele agente do fascismo.
Agora, vamos combinar que o grande culpado de toda essa provocação que vemos hoje é um nome só: Nikita Kruschev, canalha revisionista que denunciou o que ele chamou de ‘crimes de Stalin’. Foi ali que começou nossa desgraça, piorada pelo maior cão imperialista da CIA: o Gorbachov... Que ‘glasnost’ ou ‘perestroika’ porra nenhuma, aquilo foi uma missão da burguesia internacional. Ainda bem que o grande Putin da KGB está botando a Rússia nos eixos de sua antiga grandeza. Como me alegrei quando Mao Tse Tung proibiu Beethoven na ‘revolução cultural’, declarando: ‘Temos de raspar tudo que a burguesia inventou e começar de novo’.
Ainda bem que o companheiro Osama usou armas dos capitalistas contra eles mesmos... Ah, a beleza das torres caindo em Nova York! Inesquecível.
A única coisa que importa é o controle da sociedade. Temos de tutelá-la. O povo deve ser educado com o mesmo cuidado com que um jardineiro cultiva um pé de alface. Por isso, sabem os militantes como eu, que o Estado tem de ser o centro do amor ao povo que de nada sabe, por isso é belo ver como infiltramos nossos homens no Estado brasileiro. Dizem que são aparelhados, pois são, sim, deles depende nossa marcha para a vitória que almejamos. Muita vezes somos duros, sim, cruéis até, mas não ligamos, porque, como disse nosso grande líder: ‘Compaixão é um sentimento de enfermeiras, assim como a gratidão é uma doença de cachorros’. Aliás, este lero-lero de defender a democracia é só enganação. Democracia é o cacete! Usamos muito essa palavra para disfarçar e atingir nossos planos de, por exemplo, controlar essa mídia reacionária, encanar opositores, assim como nos ensina o grande sucessor de Chavez, dando uma porrada nos senadores de direita que outro dia quiseram invadir a Venezuela, vanguardeira da América Latina. E falam em direitos humanos... Idiotas. Não sabem que o homem novo que estamos forjando não sente falta da individualidade perdida. Eu conheço a beleza, o encanto infinito da servidão, a alegria de pertencer a um partido infalível. Dá um imenso alívio não ter que pensar, só obedecer.
O comunismo, camarada, é o substituto do sonho de ‘imortalidade’ dos cristãos. Comunista não morre; vira um conceito. O homem é um ser social, não é? Pois é – o ser social nunca morre. O indivíduo é uma ilusão que criou essa dor melodramática. Quem morre é pequeno-burguês. Aliás, esses sentimentos burgueses: angústia, medo, fobias, solidão, amor, paixão são bobagens psicológicas de direita que nada explicam dos homens. A verdade revolucionária está nos termos: sectarismo, alienação, aventureirismo, traição, massa atrasada e massa adiantada, revisionismo. Os operários não têm pátria. A nossa revolução é a locomotiva da história. Vamos beijar os seios nus da liberdade e tingir de sangue os lençóis dos traidores neoliberais.
Já antevejo nosso paraíso brasileiro no socialismo do século XXI:
Os grandes festivais de balalaikas russas e de pachangas cubanas, os lindos cantos de hinos sertanejos do MST, todos uniformizados em terninhos vermelhos e enxadas erguidas contra os fascistas da agro-indústria, a paz da ignorância, a visita ao campo dos refugiados burgueses obrigados a cantar a ‘Internacional’ na colheita da soja.
Estou convencido de que sou superior a esta manada de babacas, burgueses, alienados, como, por exemplo, aquela marcha de 2013, inventada pela CIA e adotada pela ‘elite branca’ que não suporta que os pobres andem de avião.
Eu sou superior, eu sou um agente da história que marchará com nossos militantes para um futuro cheio de delícias e harmonia, quando distribuiremos toda a produção como me disseram no cursinho do partido: ‘A cada um segundo suas habilidades, a cada um segundo suas necessidades.’ Nunca li Marx, mas sempre soube isso porque não precisei estudar – bastou-me o prefácio de um livro da Academia de Ciências da URRS. Os pobres são puros, e deles emana uma sabedoria que me basta. Por exemplo, pensei muito e digo: qual o problema de roubar, ou melhor, ‘desapropriar’ grana da Petrobras? Esse dinheiro todo servirá para financiar a marcha para o socialismo do século XXI, como batizou o grande Chavez.
Ah, que saudades da republica soviética, quando tudo marchava sob a batuta de Stalin com a produção industrial imensa. Claro que precisava mão de ferro para conseguir isso, e nosso guia o fez. É verdade que muitos reacionários resistiram, como os ‘kulaks’, os camponeses fascistas e sabotadores que queriam impedir a agricultura coletiva. Camponeses reacionários tinham de sumir. Teve de matar uns 20 milhões de ‘alienados’, mas era para o bem... E falam em massacre, violências e outras mumunhas, mas, como disse o traidor Trotsky: ‘Quem foi que disse que a vida humana é sagrada?’. Esta foi a sua única grande frase. O resto é lixo, que nosso Stalin raspou da terra, com a mão sagrada do vingador Ramon Mercader, no México onde Trotsky se gabava de comer a Frida Kahlo. Foi uma bela machadada naquele agente do fascismo.
Agora, vamos combinar que o grande culpado de toda essa provocação que vemos hoje é um nome só: Nikita Kruschev, canalha revisionista que denunciou o que ele chamou de ‘crimes de Stalin’. Foi ali que começou nossa desgraça, piorada pelo maior cão imperialista da CIA: o Gorbachov... Que ‘glasnost’ ou ‘perestroika’ porra nenhuma, aquilo foi uma missão da burguesia internacional. Ainda bem que o grande Putin da KGB está botando a Rússia nos eixos de sua antiga grandeza. Como me alegrei quando Mao Tse Tung proibiu Beethoven na ‘revolução cultural’, declarando: ‘Temos de raspar tudo que a burguesia inventou e começar de novo’.
Ainda bem que o companheiro Osama usou armas dos capitalistas contra eles mesmos... Ah, a beleza das torres caindo em Nova York! Inesquecível.
A única coisa que importa é o controle da sociedade. Temos de tutelá-la. O povo deve ser educado com o mesmo cuidado com que um jardineiro cultiva um pé de alface. Por isso, sabem os militantes como eu, que o Estado tem de ser o centro do amor ao povo que de nada sabe, por isso é belo ver como infiltramos nossos homens no Estado brasileiro. Dizem que são aparelhados, pois são, sim, deles depende nossa marcha para a vitória que almejamos. Muita vezes somos duros, sim, cruéis até, mas não ligamos, porque, como disse nosso grande líder: ‘Compaixão é um sentimento de enfermeiras, assim como a gratidão é uma doença de cachorros’. Aliás, este lero-lero de defender a democracia é só enganação. Democracia é o cacete! Usamos muito essa palavra para disfarçar e atingir nossos planos de, por exemplo, controlar essa mídia reacionária, encanar opositores, assim como nos ensina o grande sucessor de Chavez, dando uma porrada nos senadores de direita que outro dia quiseram invadir a Venezuela, vanguardeira da América Latina. E falam em direitos humanos... Idiotas. Não sabem que o homem novo que estamos forjando não sente falta da individualidade perdida. Eu conheço a beleza, o encanto infinito da servidão, a alegria de pertencer a um partido infalível. Dá um imenso alívio não ter que pensar, só obedecer.
O comunismo, camarada, é o substituto do sonho de ‘imortalidade’ dos cristãos. Comunista não morre; vira um conceito. O homem é um ser social, não é? Pois é – o ser social nunca morre. O indivíduo é uma ilusão que criou essa dor melodramática. Quem morre é pequeno-burguês. Aliás, esses sentimentos burgueses: angústia, medo, fobias, solidão, amor, paixão são bobagens psicológicas de direita que nada explicam dos homens. A verdade revolucionária está nos termos: sectarismo, alienação, aventureirismo, traição, massa atrasada e massa adiantada, revisionismo. Os operários não têm pátria. A nossa revolução é a locomotiva da história. Vamos beijar os seios nus da liberdade e tingir de sangue os lençóis dos traidores neoliberais.
Já antevejo nosso paraíso brasileiro no socialismo do século XXI:
Os grandes festivais de balalaikas russas e de pachangas cubanas, os lindos cantos de hinos sertanejos do MST, todos uniformizados em terninhos vermelhos e enxadas erguidas contra os fascistas da agro-indústria, a paz da ignorância, a visita ao campo dos refugiados burgueses obrigados a cantar a ‘Internacional’ na colheita da soja.
E há o grande, imponente monumento do Homem Novo, uma cópia do ‘David’ de Michelangelo com grande bandeira vermelha, hasteada em seu pênis revolucionário.
E finalmente a visita ao Museu Lula, onde está seu corpo embalsamado para toda a eternidade.”
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