Estrangulamento Financeiro Judicial
Artigo no Alerta Total – www.alertatotal.net
Por Carlos Henrique Abrão
A partir da vigência da Lei Complementar 151, de 5 de agosto de 2015, na maioria dos casos, principalmente nas cortes estaduais, teremos a fenomenologia do estrangulamento financeiro judicial, haja vista que os depósitos administrativos e judiciais, no respeitante a 70% poderão, sem a solução da causa, ser levantados pelos intitulados credores, a União, Estados , Municípios, e também o Distrito Federal.
A crise que assola o País é absolutamente incomparável com as anteriores, e se espalha com o brutal aumento dos pedidos de insolvência de empresas e recuperação judicial, alastrando-se o fogo da falência do Estado para a atividade empresarial privada.
Em contrapartida ao levantamento dos valores, terão os entes federados que constituir um fundo de reserva para cobertura e nos limites do equilibrio atuarial contábil para, na eventualidade, de perder a demanda, ter saldo suficiente à restituição.
Incrivelmente, os precatórios cujos pagamentos se eternizam se contrapõem com o levantamento prematuro pela administração direta, expondo as feridas nuas e cruas da dificultosa administração da máquina judiciária.
Cabe ponderar que se grandes estados da federação já começam a parcelar os vencimentos dos seus servidores, por falta de caixa, o judiciário, de uma forma geral, atravessará, sem a menor dúvida, a mais gritante crise de sua história.
Minguarão os recursos financeiros acarretando um verdadeiro gargalo na atividade que já é lenta, sem pessoal à altura e com mínima e precária infra estrutura.
No mínimo temos diante de nós uma ilegalidade,ou flagrante inconstitucionalidade, como queiram chamar. Isso é irrelevante, pois que os bancos públicos oficiais responsáveis pelos depósitos terão prazo para o repasse e quando a administração não repuser o numerário, responderão as instituições financeiras.
Eis mais uma ótica que viola elementares princípios da boa contabilidade orçamentária. E o que é sintomaticamente emblemático diz respeito à soma infindável de recursos a agravar e agudizar o cenário.
O Estado, em sentido amplo, não se renderá à derrota e empunhará todos os recursos possíveis e inimagináveis para não transitar em julgado o decisório e consequentemente transformar em agruras o sofrimento do contribuinte que não deve e tem direito, por fazer jus à restituição.
Criamos assim uma espécie de precatório reverso. Eis que discuto na justiça eventual hipótese de incidência ou exação, mas se vier a ganhar, e tendo depositado a título de garantia a soma, devo esperar anos a fio para que o estado restitua na sua inteireza, e de forma indexada, a importância de antemão levantada. Nada mais surreal e artificial.
O ente federado recalcitrante poderá ser punido e até perder o direito ao levantamento se acaso não mantiver em dia a conta saldo do fundo. Porém o ponto crucial é a perda de receita indireta do judiciário de uma forma geral.
No passado, muitos bancos estaduais quebraram com operações ARO, a denominada antecipação de receita orçamentária feita aos Estados, e esse aspecto poderá colapsar ainda mais as entidades bancárias públicas oficiais.
Nada obstante,o spread pago à conta do judiciário será vertiginosamente reduzido e existirá, não é dramatização, ou teatralização, um problema de sucateamento da máquina já em andamento, corroborado pela escassez de receitas e aumento substancial das despesas.
Desta forma,a Lei Complementar 151/15 representa um verdadeiro retrocesso para o combalido orçamento da esfera judicial, sem que possa contratar escreventes, funcionários para seus postos e até mesmo magistrados.
O fundo a ser constituído será administrado e gerido pela própria instituição financeira com escrituração individual, e transparência na sua formação, o que tornará uma verdadeira incógnita em termos de real
funcionalidade.
São apenas 13 artigos que permitem retirar todas as esperanças do futuro amanhã do judiciário. Um grito de alerta, já que costumeiramente não se aprova o orçamento conforme se postula, mas sempre com glosas que oscilam entre trinta a quarenta por cento.
Demais disso, os recursos levantados estão vinculados ao pagamento de precatórios, dívida pública fundada, despesas de capital, recomposição dos fluxos de pagamento e do equilibrio atuarial dos fundos de previdência.
E quem realmente fiscalizará essa meta? Serão os Tribunais de Contas, a Controladoria Geral da União, ou, dentro do seu limite de competência, pagamento de precatórios, o próprio judiciário?
É uma questão aberta a ser resolvida e com nítida transparência, a fim
de que não se alegue falta de recursos financeiros no pagamento dos precatórios. Uma montanha de dinheiro será retirada do judiciário, soma de bilhão, a qual tinha um lastro para ser revertida em prol da instituição nos múltiplos aspectos de administração e benefícios gerados na prospecção de alternativas para a crise do seu próprio orçamento.
A persistir os malsinados efeitos da legislação, o que se passa a refletir é estando quebrados os entes da administração direta, sua crise não tem como se alastrar para os demais poderes independentes e autônomos da federação.
Que toda a população e a sociedade civil se conscientizem do que está em vigor, a fim de que não vilipendeiem ainda mais o judiciário, com explosão de processos, custo benefício inócuo, e o substancial enxugamento de recursos financeiros direta e indiretamente.
A crise, com a Lei Complementar, está definitivamente instalada no Judiciário Nacional e sem sua revogação ou modulação de percentuais seu prazo de duração corresponderá aquele dos pagamentos dos precatórios. Quem viver verá.
Carlos Henrique Abrão, Doutor em Direito pela USP com Especialização em Paris, é Desembargador no Tribunal de Justiça de São Paulo.
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