Crise Fiscal Brasileira de 2015/2016
Para analisar a Crise Fiscal Brasileira iniciada em 2015 é importante voltar pelo menos uma década e entender os caminhos que nos levaram à recessão vivenciada atualmente. O ano de 2005 ficou marcado pelo fim do acordo do Brasil com o FMI que visou a recuperação da economia do país, devassada pela Crise Cambial Brasileira de 1999. Com a superação da crise o país finalmente se viu livre de uma tutela externa que durante sete anos impediu que o governo brasileiro executasse uma gestão autônoma de sua economia. No mesmo período o mundo assistia a um exuberante superciclo das commodities impulsionado pela aceleração do crescimento da China. O Brasil foi um dos grandes beneficiados deste cenário e registrou records históricos de produção e exportação principalmente de minério de ferro e petróleo. A euforia era generalizada e enormes quantias de recursos estrangeiros passaram a ser direcionados para investimentos diretos no país.
Tomado pelo clima de otimismo, o governo brasileiro iniciou um longo período de gastança e abriu mão de realizar os investimentos necessários para que o Brasil enfim se consolidasse como uma superpotência mundial. Pouco se fez nas áreas de educação, saúde, segurança, gestão da dívida pública e reformas estruturais. Pouco se investiu na indústria, tecnologia, infraestrutura, comércio exterior e na diversificação da economia brasileira.
Uma década se passou e a educação pública continua de péssima qualidade, a saúde continua sucateada, a seguridade social continua em dificuldades e a carga tributária continua sufocando as empresas e os cidadãos brasileiros. O Brasil continua com uma infraestrutura precária e de custo extremamente elevado o que diminui consideravelmente a competitividade do país. O país continua extremamente dependente da China, EUA e Europa e na última década praticamente não celebrou acordos comerciais com outros países. A indústria brasileira encolheu e o país continua extremamente dependente da produção de matérias-primas e produtos de baixo valor agregado. Em pleno século XXI o Brasil ainda é um país essencialmente de economia primária!
Erros de gestão do governo federal
Por outro lado, o governo federal optou pela distribuição de benesses no Brasil e no mundo!
No cenário externo o Brasil promoveu o perdão das dívidas de diversos países africanos como Tanzânia, Costa do Marfim, Gabão, Guiné, Guiné-Bissau, Congo, São Tomé e Príncipe e Angola. O país também promoveu vultosos empréstimos a países da América Latina, como Cuba, Venezuela, Equador, Bolívia entre outros. Foram mais de 3.000 empréstimos pelo mundo, a maioria tratada com sigilo de estado, cobrando juros notadamente inferiores aos cobrados pelos empréstimos realizados às empresas brasileiras.
No cenário interno os empréstimos subsidiados foram destinados prioritariamente para um grupo de empresas cuidadosamente escolhidas pelo governo, deixando em segundo plano os investimentos em micro, pequenas e médias empresas. Tudo isso a base de um gigantesco endividamento do BNDES com o Tesouro Nacional que ultrapassa os 500 bilhões de Reais.
No cenário externo o Brasil promoveu o perdão das dívidas de diversos países africanos como Tanzânia, Costa do Marfim, Gabão, Guiné, Guiné-Bissau, Congo, São Tomé e Príncipe e Angola. O país também promoveu vultosos empréstimos a países da América Latina, como Cuba, Venezuela, Equador, Bolívia entre outros. Foram mais de 3.000 empréstimos pelo mundo, a maioria tratada com sigilo de estado, cobrando juros notadamente inferiores aos cobrados pelos empréstimos realizados às empresas brasileiras.
No cenário interno os empréstimos subsidiados foram destinados prioritariamente para um grupo de empresas cuidadosamente escolhidas pelo governo, deixando em segundo plano os investimentos em micro, pequenas e médias empresas. Tudo isso a base de um gigantesco endividamento do BNDES com o Tesouro Nacional que ultrapassa os 500 bilhões de Reais.
O crescimento da economia se deu por um espetacular superciclo de commodities que apoiou as políticas do governo federal marcadas pela formação de bolhas que beneficiaram setores já consolidados de nossa economia. Como plano de fundo, a questão social sempre foi a justificativa oficial para os programas de governo.
O programa Minha Casa Minha Vida lançado em 2009, encheu o povo brasileiro de esperança da conquista da casa própria, mas na realidade se mostrou um gigantesco e orquestrado movimento de repasse de dinheiro público para as grandes construtoras do país. O programa tinha um grande potencial quando o governo anunciou que ajudaria as classes menos favorecidas subsidiando a compra da casa própria até o valor de 20.000,00. Dado o aumento da demanda, em pouco tempo todos os imóveis subiram de preço na mesma proporção e os verdadeiros beneficiários dos subsídios acabou sendo as construtoras e não a população. Apesar disso foi um importante movimento, pois reaqueceu o setor que poderia a partir de então desenvolver uma dinâmica própria de crescimento continuado. Porém o governo decidiu por ceder ao lobby das grandes construtoras e passou a reajustar sucessivamente os limites dos subsídios, alimentando um movimento que veio a se tornar uma imensa bolha especulativa no setor imobiliário. Como resultado, atualmente a maioria dos brasileiros está ainda mais distante de conquistar a casa própria do que estava antes do plano, já que os preços dos imóveis subiram bem acima do crescimento médio da renda dos brasileiros. Os verdadeiros ganhadores deste plano foram as construtoras, grandes investidores e os cidadãos mais favorecidos que já possuíam bens imobiliários e viram o valor de seus patrimônios dispararem.
Em 2010 a redução do IPI também é um exemplo concreto de que o governo alimentou o crescimento através de bolhas setoriais. Cedendo ao lobby da indústria automobilística o Brasil promoveu uma generosa renúncia fiscal em favor do setor. A intensa propaganda de redução do IPI levou a um abrupto aumento da demanda de automóveis por parte da população, tendo como consequência o reajuste dos preços dos veículos na mesma proporção da redução do IPI. Cabe observar que todas as montadoras de automóveis instaladas no Brasil são multinacionais. Mais uma vez o grande beneficiado não foi o povo, mas a indústria que acabou promovendo gigantescas remessas de lucros para o exterior. Um movimento semelhante foi promovido para o setor de eletrodomésticos, também marcado por empresas estrangeiras, através da redução do IPI da chamada linha branca.
A partir de 2011, o governo brasileiro promoveu de forma artificial uma intensa e insustentável redução da taxa básica de juros que rapidamente alimentou uma nova bolha do consumo. Todas as sucessivas bolhas alimentadas pelo governo federal estouraram! Todos os setores que o governo beneficiou agora estão paralisados! A consequência mais nefasta se revela na disparada do desemprego por todo país! O resultado que fica são empresas com extrema dificuldade para honrar seus compromissos e uma população super-endividada e desempregada!
Corrupção e má gestão na Petrobrás
O desvio de recursos públicos é um dos importantes componentes das recorrentes elevações de déficits fiscais experimentados pelo Brasil nos últimos anos. Para cobrir os rombos da má gestão e da corrupção a dívida interna brasileira disparou e atualmente está acima de 2.7 trilhões de Reais. O financiamento da rolagem da dívida ocupa hoje impressionantes 40% do orçamento da União Federal o que beneficia diretamente os bancos e estrangula a capacidade do país em investir nas questões primordiais para o seu desenvolvimento.
Se tem uma coisa que todo brasileiro convive há décadas é com escândalos de corrupção. A lista é enorme e é interessante observar que cada um dos erros de gestão apontados na seção anterior apresenta como plano de fundo um escândalo de corrupção que indica o pagamento de propinas. Entre Caixa 2, Mensalão, Correios, BNDES e Eletrolão, para citar alguns dos mais comentados, o Petrolão, guarda relação direta com a crise atual. O último laudo pericial da operação Lava a Jato aponta para perdas acima de 40 bilhões em desvios de recursos da Petrobrás em favor de empreiteiras e políticos.
A má gestão provocou prejuízos ainda maiores. As bolhas alimentadas pelos programas governamentais sem a devida contraparte de aumento de oferta passaram a pressionar os preços de forma generalizada. Incapaz de controlar a inflação o governo federal voltou a lançar mão das famigeradas práticas de congelamento de preços que tanto prejudicou o país na década de 80. Um dos alvos escolhidos foi a Petrobrás. Em meio ao boom mundial das commodities, a Petrobrás foi obrigada a manter os preços estáveis no mercado interno a despeito de ter que importar gasolina e diesel a preços muito superiores aos que podia vender. Esta prática levou a prejuízos que ultrapassaram os 60 bilhões de Reais.
Outro ponto de destaque foi o desastroso processo de capitalização da empresa em 2010 que tinha o objetivo de levantar recursos para realizar os investimentos previstos pela estatal nos anos seguintes. O governo federal "Levou, mas não pagou". A União participou do processo de capitalização e elevou sua fatia no capital social da empresa, porém ao invés de pagar efetivamente pelas ações adquiridas lançou mão de outro tipo de moeda: o petróleo da camada de pré-sal ainda não explorado, que pertence à União. O processo de capitalização tinha como objetivo justamente levantar recursos para viabilizar a exploração do pré-sal e inacreditavelmente o governo federal decidiu que a empresa receberia os recursos somente após a exploração se concretizar.
Corrupção e má gestão levaram a Petrobrás a ser a empresa mais endividada do mundo no setor com uma dívida que ultrapassa a cifra de 500 bilhões de Reais o que levou a derrocada da empresa que agora é obrigada a se desfazer de ativos e diminuir consideravelmente seu plano de investimento para os próximos anos.
Acontece que a Petrobrás é responsável direta ou indiretamente por quase 10% do PIB brasileiro. A crise da Petrobrás provocou a demissão indireta de milhares trabalhadores de empresas fornecedoras. Como consequência do necessário plano de desinvestimentos, a própria estatal já demitiu mais de 10 mil trabalhadores diretos. As estimativas mais recentes apontam que a drástica redução dos investimentos da Petrobrás terá impacto negativo de aproximadamente 2% no PIB brasileiro só em 2016. E este impacto tende a se estender nos anos seguintes.
Intervenções na economia
Outra marca do governo petista são as constantes intervenções na economia. As taxas de juros artificialmente baixas foi patrocinada diretamente pelos bancos estatais, que também foram obrigados a operacionalizar as chamadas pedaladas fiscais. A intervenção nos preços da gasolina também impactou diretamente a indústria do etanol, devido a impossibilidade de reajuste de preços acima de 70% do preço da gasolina, sob pena de uma enorme queda de demanda. Em uma só tacada o governo conseguiu destruir dois orgulhos brasileiros: a Petrobrás e o etanol.
Outro setor extremamente prejudicado pelas intervenções governamentais foi o setor elétrico. Também com o objetivo de controlar a inflação artificialmente, no segundo semestre de 2012 a presidente Dilma anunciou a redução forçada do preço das tarifas de energia elétrica, atrelada à renovação antecipada dos contratos de concessão. As geradoras de energia reagiram alegando que teriam prejuízo com as condições estabelecidas e a maior parte da renovação das concessões recaiu na conta das próprias estatais. A Eletrobrás hoje amarga enormes prejuízos e, a exemplo da Petrobrás, trabalha com um extenso plano de desinvestimentos. As geradores de energia que perderam suas concessões puderam continuar operando as hidrelétricas enquanto não fossem realizados novos leilões, porém não puderam renovar os contratos de fornecimento, levando as distribuidoras a única alternativa de comprar energia no mercado livre.
Com o aumento da demanda por parte das distribuidoras além da necessidade de acionamento das termoelétricas resultante da crise hídrica, o preço da energia no mercado livre disparou. Porém a prática de congelamento de preços do governo federal impediu o repasse do aumento aos consumidores provocando rombos gigantescos em todas as empresas que perderam suas concessões. Com o setor elétrico subitamente se tornando deficitário os investimentos cessaram aumentando consideravelmente os riscos de falta de energia nos anos seguintes. A recente disparada dos preços da eletricidade visa repor parte das perdas provocadas pelas mal sucedidas intervenções governamentais no setor e contribui diretamente para o cenário atual de estagflação, caracterizado por uma economia em recessão e com inflação elevada.
Fim do Super Ciclo das Commodities
Durante mais de uma década, o Brasil cresceu amparado pelo boom das commodities no mercado internacional. A esperada desaceleração da economia Chinesa aliada a recuperação dos estoques internacionais e ao encerramento do movimento de expansão monetária nos EUA marcam o fim do super ciclo das commodities.
A partir de agora o país terá que andar com as próprias pernas e não poderá mais contar com os elevados preços dos produtos primários para sustentar seu crescimento. O impacto na arrecadação já se manifesta nas contas das empresas e dos governos. O país não se preparou para este momento e optou por práticas populistas de curto prazo abrindo mão de realizar as reformas estruturais necessárias para sustentar o crescimento do país no longo prazo.
O fim do super ciclo das commodities é um duro golpe contra a economia brasileira e representa outro fator importante que explica a crise fiscal que assola o país.
Crise política
A crise política é caracterizada por uma verdadeira obstrução do Congresso Nacional aos projetos vindos do poder executivo. Por motivações distintas oposição e parte da base aliada ao governo se uniram na tentativa de impor suas ideias em detrimento da necessidade urgente de aprovação das medidas enviadas ao congresso. O impasse político é resultado direto dos escândalos de corrupção que atingem o governo e sua base aliada além das sequelas deixadas pelo atribulado embate eleitoral entre o governo e oposição.
A incapacidade de articulação política da presidenta bem como suas trapalhadas na área fiscal levaram Dilma Roussef a enfrentar um processo de Impeachment que deve tomar conta de boa parte das atividades do Congresso Nacional no primeiro trimestre de 2016.
Embora o processo Impeachment possa causar ainda mais instabilidade política, o enfrentamento vem em boa hora e se faz mais do que necessário. O resultado, qualquer que seja ele, poderá ser capaz de por fim à crise política uma vez que determinará uma maioria no poder legislativo capaz de garantir condições de governabilidade para o presidente da república derivado da disputa.
Embora o processo Impeachment possa causar ainda mais instabilidade política, o enfrentamento vem em boa hora e se faz mais do que necessário. O resultado, qualquer que seja ele, poderá ser capaz de por fim à crise política uma vez que determinará uma maioria no poder legislativo capaz de garantir condições de governabilidade para o presidente da república derivado da disputa.
Considerações finais
A crise brasileira atual é primordialmente uma crise de confiança. Investidores brasileiros e internacionais não acreditam mais na eficácia da condução da política econômica do governo PT e não sentem-se seguros de que poderão investir sem que haja intervenções governamentais. Apenas resultados concretos poderão restaurar a confiança, mas resultados concretos demoram a aparecer. O governo PT perdeu o benefício de crer para ver. O mercado agora exige ver os resultados antes de arriscar seus investimentos no país.
Há tempos o Brasil vem adiando a realização de reformas estruturais necessárias à nação. Não é de hoje que se fala na necessidade de reforma política, reforma da previdência, reforma tributária, reforma da saúde, reforma da educação, reforma do judiciário etc. Os erros de gestão do governo federal são inegáveis! Porém a falta de vontade política é o principal fator que impede o Brasil de alçar vôos maiores. A pauta é enorme, mas nunca sai do papel. A falta de vontade política está intimamente ligada à prioridade dos políticos pela manutenção do "statu quo", pela manutenção de um ambiente propício às barganhas e práticas de corrupção.
Apesar de tudo ainda tenho esperança. Acredito na prevalência das instituições democráticas, com destaque para a Polícia Federal e Ministério Público, bem como numa mudança da maneira de votar do eleitor brasileiro. Momentos como o atual deixam importantes aprendizados. A situação é extremamente complicada! Não há caminho fácil, mas existem caminhos que podem ser percorridos...
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