Espanha despede-se do homem “que tornou a democracia possível”
Figura da transição pós-franquista, saiu do franquismo para desmantelar o franquismo, sem rupturas. Só esteve no poder cinco anos e meio mas nenhum chefe de Governo iniciou tantas reformas e enfrentou tantas pressões.
Fez muito em muito pouco tempo, durante o mais incerto período da transição espanhola. Entre 1976 e 1977, nos onze meses depois de ser nomeado por Juan Carlos para chefiar o Governo, conseguiu que as Cortes franquistas aprovassem a Lei para a Reforma Política, assinando assim a sua própria sentença de morte, legalizou partidos e sindicatos, amnistiou presos políticos, criou um novo partido, a UCD, organizou o regresso do exílio dos principais líderes do Partido Comunista e as primeiras eleições democráticas, que venceu.
Foi artífice e motor da transição, mudou a História de Espanha – jornalistas e políticos não pouparam palavras na despedida a Adolfo Suárez, este domingo. O primeiro chefe de Governo eleito democraticamente em Espanha morreu aos 81 anos, onze anos depois de se saber que sofria de Alzheimer, dois dias depois do seu filho ter anunciado que o fim estava próximo.
O actual primeiro-ministro, o conservador Mariano Rajoy descreveu-o como “uma das figuras mais importantes e positivas” da História espanhola, o “homem que tornou possível a democracia em Espanha e abriu as portas da Europa”.
A transição vacilava quando o rei o escolheu para chefiar o Governo. Os sectores mais conservadores do regime não perdoaram a escolha de um político tão jovem, de apenas 43 anos, e com tão pouca experiência – suficiente, ainda assim, para a oposição desconfiar dele. Suárez já tinha sido governador civil, procurador nas Cortes por Ávila (onde nasceu), director da televisão pública e ministro secretário-geral do Movimento, o partido único; não poderia ser a liderar a transformação democrática do país. Não podia, mas foi.
“Surpreendeu quase todos. Vinha do antigo regime mas tinha clara a visão de avançar para a democracia. Conhecia a estrutura que queria desmontar”, lembrou o socialista Alfonso Guerra. “Soube unir aqueles que partilhavam com ele o compromisso pela liberdade”, disse o líder do Partido Socialista, Alfredo Pérez Rubalcaba, apontando os Pactos da Moncloa (reformas económicas) e a Constituição como “o melhor reflexo da sua inteligência para alcançar acordos”.
A rapidez com que as reformas foram negociadas e as mudanças concretizadas impressiona. Nem duas semanas depois da vitória nas urnas, a 15 de Junho de 1977, apresentava a candidatura de Espanha à então Comunidade Económica Europeia. Menos de quatro meses depois, autorizava o regresso do exilado presidente da Generalitat (governo regional da Catalunha), Josep Tarradellas.
Fez tudo isto sem rupturas, num processo para o qual não havia modelos, confiando na sua intuição e insistindo num discurso do entendimento. O politólogo Ignacio Sánchez-Cuenca escreve que Suárez tinha “pragmatismo a sair pelos poros da pele”. Assim venceu duas eleições, as de 1977 e as de 1979.
Ainda era secretário-geral do Movimento quando fez os primeiros apelos ao diálogo – o “esforço comum” ou “pacto” que defendia como fundamental naquele período. “Vamos, simplesmente, tirar o dramatismo da nossa política. Vamos tornar normal o que, na rua, é simplesmente normal”, disse diante das últimas Cortes franquistas. Um discurso que nunca abandonou, apesar da convulsão permanente. Aos atentados de grupos fascistas, dos separatistas da ETA, dos GRAPO (organização de extrema-esquerda envolvida no assassínio de mais de 80 pessoas durante a transição) juntavam-se sucessivas greves e manifestações, com a inflação e o desemprego a dispararem.
Suárez entregou a demissão ao rei a 29 de Janeiro de 1981. “Estava psicologicamente arrasado, após cinco anos de circunstâncias muito difíceis”, escreve o historiador Javier Tusell. À crispação política alimentada pela oposição socialista, juntava-se a crescente pressão militar – as chefias não lhe perdoavam a legalização dos comunistas – e as lutas internas dentro do seu próprio partido.
A data escolhida para a passagem de testemunho coincidiu com a tentativa de golpe do 23-F. Nesse dia, quando o tenente-coronel Antonio Tejero e os seus homens irromperam pelo Congresso aos gritos de “Todos no chão”, Suárez ficou sentado – o mesmo fizeram apenas outros dois políticos, o seu vice-presidente e ministro da Defesa Gutiérrez Mellado e o secretário-geral do PCE, Santiago Carrillo.
O actual primeiro-ministro, o conservador Mariano Rajoy descreveu-o como “uma das figuras mais importantes e positivas” da História espanhola, o “homem que tornou possível a democracia em Espanha e abriu as portas da Europa”.
A transição vacilava quando o rei o escolheu para chefiar o Governo. Os sectores mais conservadores do regime não perdoaram a escolha de um político tão jovem, de apenas 43 anos, e com tão pouca experiência – suficiente, ainda assim, para a oposição desconfiar dele. Suárez já tinha sido governador civil, procurador nas Cortes por Ávila (onde nasceu), director da televisão pública e ministro secretário-geral do Movimento, o partido único; não poderia ser a liderar a transformação democrática do país. Não podia, mas foi.
“Surpreendeu quase todos. Vinha do antigo regime mas tinha clara a visão de avançar para a democracia. Conhecia a estrutura que queria desmontar”, lembrou o socialista Alfonso Guerra. “Soube unir aqueles que partilhavam com ele o compromisso pela liberdade”, disse o líder do Partido Socialista, Alfredo Pérez Rubalcaba, apontando os Pactos da Moncloa (reformas económicas) e a Constituição como “o melhor reflexo da sua inteligência para alcançar acordos”.
A rapidez com que as reformas foram negociadas e as mudanças concretizadas impressiona. Nem duas semanas depois da vitória nas urnas, a 15 de Junho de 1977, apresentava a candidatura de Espanha à então Comunidade Económica Europeia. Menos de quatro meses depois, autorizava o regresso do exilado presidente da Generalitat (governo regional da Catalunha), Josep Tarradellas.
Fez tudo isto sem rupturas, num processo para o qual não havia modelos, confiando na sua intuição e insistindo num discurso do entendimento. O politólogo Ignacio Sánchez-Cuenca escreve que Suárez tinha “pragmatismo a sair pelos poros da pele”. Assim venceu duas eleições, as de 1977 e as de 1979.
Ainda era secretário-geral do Movimento quando fez os primeiros apelos ao diálogo – o “esforço comum” ou “pacto” que defendia como fundamental naquele período. “Vamos, simplesmente, tirar o dramatismo da nossa política. Vamos tornar normal o que, na rua, é simplesmente normal”, disse diante das últimas Cortes franquistas. Um discurso que nunca abandonou, apesar da convulsão permanente. Aos atentados de grupos fascistas, dos separatistas da ETA, dos GRAPO (organização de extrema-esquerda envolvida no assassínio de mais de 80 pessoas durante a transição) juntavam-se sucessivas greves e manifestações, com a inflação e o desemprego a dispararem.
Suárez entregou a demissão ao rei a 29 de Janeiro de 1981. “Estava psicologicamente arrasado, após cinco anos de circunstâncias muito difíceis”, escreve o historiador Javier Tusell. À crispação política alimentada pela oposição socialista, juntava-se a crescente pressão militar – as chefias não lhe perdoavam a legalização dos comunistas – e as lutas internas dentro do seu próprio partido.
A data escolhida para a passagem de testemunho coincidiu com a tentativa de golpe do 23-F. Nesse dia, quando o tenente-coronel Antonio Tejero e os seus homens irromperam pelo Congresso aos gritos de “Todos no chão”, Suárez ficou sentado – o mesmo fizeram apenas outros dois políticos, o seu vice-presidente e ministro da Defesa Gutiérrez Mellado e o secretário-geral do PCE, Santiago Carrillo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário